quinta-feira, 24 de novembro de 2011

ESPERANÇA

Celeste Novas

Estive estudando a Parashá dessa semana que se chama “Chaiêi Sarah”, no hebraico ou “a vida de Sara”, que se encontra em Bereshit (Gn.) 23:1-25. Pensei em escrever sobre esse tema, mas recordei-me de quantas parashiot já preparei e já ouvi e já li sobre esse mesmo tema.

Enquanto meditava o telefone tocou. Era uma jovem, voluntária de uma instituição chamada CAASAH – Casa de Apoio aos portadores de HIV (www.caasah.com.br). Como já há algum tempo tenho me dedicado a ajudá-los, ela me convidou para o aniversário de 20 anos de fundação que seria realizado nesse dia 17/11/2011, às 19:00h. Temos contato há uns dois anos, mas não a conhecia pessoalmente nem à instituição, apenas faço as contribuições via um moto-boy que recolhe as ofertas. Decidi que esse seria o dia em que iria até lá.

Sabe aquele dia em que você diz: “Valeu à pena viver para experimentar este dia?” Pois é! Eu imaginava um lugar triste, fechado, cheio de mortos-vivos se arrastando...

Nada disso! É um lugar cheio de crianças que em sua maioria não conhece quem as colocou no mundo, sem família biológica. Soropositivas, contaminadas pelos seus pais, algumas desenvolveram também câncer, mas estão cheias de vida devido aos cuidados que recebem das pessoas responsáveis pela instituição. São profissionais da área de saúde e educação, voluntários de um modo geral, pessoas que se dedicam diariamente a cuidar agora não só das crianças, mas também de adultos como: moradores de rua, prostitutas, drogados, todos contaminados pelo HIV. Presenciei alí o submundo da sociedade, sendo cuidado com tanto carinho.

Conheci um garoto que chegou lá com aproximadamente um ano de idade e hoje está com 15. Foi encontrado na rua sozinho e não se tem conhecimento de nenhum parente. Nunca recebeu uma visita. É soropositivo e está sendo tratado de um câncer na laringe. A jovem me disse que ele já ressuscitou três vezes e que é uma história de superação. Tão magrinho... Enquanto eu o abraçava, preocupada em não machucá-lo ele disse com uma vozinha baixa devido ao câncer, mas feliz: “Ele falou de mim, eu sou esperança!” É que o apresentador falou ao microfone sobre uma criança da casa sem citar o nome, cognominando-o de “esperança”.

D’us! Pensei. Como existem coisas ao nosso redor que não nos damos conta! Como o nosso mundo particular é medíocre!

Enquanto a festa se desenrolava no jardim, com mesas bem ornamentadas, toldos, luzes, som e muitos doces, salgados e refrigerantes, fui aos alojamentos das crianças menores, ao dos adolescentes e ao berçário.

Ah... O berçário! Havia vários bercinhos com bebês bem cuidados dormindo. A jovem que me acompanhava foi-me contando a história de cada um deles: “Essa é a Manuela, tem quatro meses e foi abandonada na maternidade”. A mãe? Uma moradora de rua soropositiva. O outro, o Lucas, e os outros, também. Cada um daqueles bebês tinha a mesma história. Uma luzinha tênue e uma canção infantil baixinha completavam o ambiente. Numa saleta ao lado uma senhora agradável preparava os medicamentos. Em uma bandeja vários copinhos descartáveis contendo em cada um deles alguns comprimidos, necessários para garantir o tempo e a qualidade de vida daqueles pequenos, tanto dos bebês como das crianças menores e dos adolescentes. Ela contava e recontava, para não errar a quantidade de cada um deles enquanto nos recebia.

Um jovem cantava lindamente um louvor ao Eterno e depois mais outro, enquanto no telão podíamos ler alguns salmos.

Depois, foram-nos apresentadas as pessoas que trabalhavam alí. A cada apresentação os internos aplaudiam fazendo uma algazarra alegre.

Lembrei-me do mandamento do Senhor em Devarim (Deuteronômio) 15:11 que diz: “Pois nunca deixará de haver pobre na terra; pelo que te ordeno, dizendo: Livremente abrirás a tua mão para o teu irmão, para o teu necessitado, e para o teu pobre na tua terra.”

Que alegria é ter a Palavra de D’us para nos guiar! Veja o que esse texto diz: “teu irmão, o teu necessitado, e o teu pobre”. O TEU! Mas, por quê nossos?

Analisando Bereshit (Gn.)1:31a “E viu D’us tudo quanto tinha feito, e eis que era muito bom”, vemos que não foi D’us quem criou a pobreza, o abandono, a ruína e a miséria na terra, pois tudo o que Ele fez é "muito bom”.

Somos nós que “fabricamos” os pobres quando elegemos os maus governantes, ou quando governamos mal. Quando discriminamos ou excluímos as pessoas apenas por serem diferentes de nós, dando lugar ao nosso egoísmo e vaidade. Quando permitimos e até alimentamos a corrupção, a má distribuição de renda e o desamor. Quando não ensinamos sobre D’us às pessoas e mostramos a elas que “Feliz é a nação cujo D’us é ADONAI (yhwh)” (Salmos 33:12), para que meditem sobre “quem é o deus do nosso País e quem é o nosso deus”.

A palavra hebraica que tem sido utilizada para definir “caridade” é Tsedaká (צדקה), porém ela é muito mais do que isso. Ela significa integridade, justiça, a coisa certa a fazer. D'us permitiu que existissem pobres e ricos para que os seres humanos exercessem bondade e justiça uns com os outros, transformando seu livre arbítrio em ações positivas. Creio que o Eterno tem permitido a miséria neste mundo para que sua misericórdia seja conhecida por nós. Entretanto, se falharmos, o mundo se aprofundará na desgraça, na pobreza e na desesperança. Por que será que a miséria tem tomado proporções grandiosas em nossos dias? Onde estão os talmidim (discípulos) de Yeshua (Jesus)?

Confesso a vocês, que leem este post, que hoje estou me sentindo gratificada pela noite que o Eterno preparou para mim naquele lugar. Ele confirmou o que já me incomodava há muito tempo. Que precisamos sair do nosso comodismo espiritual e religioso e nos lançarmos naquilo que Ele já tem nos capacitado para cuidar.

O Rabi Yeshua nos alerta em Lucas 16:8b “os filhos deste mundo são mais prudentes na sua geração do que os filhos da luz”. E a palavra prudência deriva do latim “virtude”. Foi o que vi na CAASAH!

Fonte: http://www.buscandoasraizes.blogspot.com/ (Postado em 18/11/2011).

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